Terreiro do Paço

terça-feira, 24 de dezembro de 2013


Levanto-me todos os dias à mesma hora, seja dia de trabalho ou de descanço, como hoje, assim acordei pus uns trapos por cima do corpo sulcado de rugas e dirigi-me à Pastorinha onde tomo a bica matinal, ainda era de noite prái seis e meia, os neons ainda estavam ligados na noite fria e tempestuosa que me impedia de acender os cigarros que fumo uns a seguir aos outros, na Pastorinha hoje não havia mesas estava tudo ocupado por um balcão improvisado onde se expunham as iguarias próprias desta época dita festiva, lampreias de ovos, bolos rei troncos de Natal, filhós azevias, enfim tudo o que as pessoas compram mesmo que depois grande parte vai para o lixo, sem querer a minha mente apanhou o autocarro e desceu no Marquês Pombal, a minha mente desceu a Avenida da Liberdade, logo no primeiro vão um homem ou mulher dormia com cartões a servir-lhe de cobertores, a esse vão outros se seguiram com outros cartões tapando outros corpos que são corpos de pessoas como eu e como tu que eventualmente me leias, chovia, chovia torrencialmente mas aqueles corpos habituados ao sofrimento por nada davam como as outras pessoas que por elas passarão quando for mais dia nada darão, estarão atarefadas na compra da ultima prenda, do ultimo acepipe, e aquelas pessoas ali caladas e resignadas sem um único esgar de sofrimento, escondem-no talvez com vergonha de o mostrarem, é gente, gente como nós que direito a ter um tecto que não seja a chuva e roupas a tapar-lhe o corpo que não sejam cartões.

A minha mente por vezes é rebelde e deixa de me obedecer, chama-ma, leva-me atrás dela e assim foi desta vez levou-me ao Terreiro do Paço onde por cima dos respiradouros do metro montes de corpos se aninhavam para absorverem o pouco calor que dessas frestas emanava, pegou-me depois pela mão e levou-me para a Almirante Reis, a paisagem nesta Lisboa de lufa lufa era a mesma, corpos debaixo de cartões com a cidade a acordar indiferente, connosco  a acordarmos indiferentes, não somos pessoas, somos bestas que apenas pensamos no nosso bem melhor estar, se temos um Fiat queremos um BMW, se moramos num T2 queremos no mínimo um T3 e os outros que se lixem, comam o que encontrarem nos contentores ou não comam nem durmam, não os consideramos iguais consideramo-los lúmpen, merda que afastamos com o bico do sapato, dejectos de uma sociedade calibrada para o consumo desenfreado e a miséria.

Eu que estou para aqui a rabiscar isto armado em Xico moralista não sou diferente, logo vou jantar com o meu filho, bebo uns copos de vinho, fumo umas brocas e sei mas sei de certeza feita que isto que aqui deixo alinhavado não me vai vir à memória nada disto me vai vir à memória, sei mesmo que quando for para casa dele, mora próximo da Avenida da Liberdade, não irei por aí vou pelo Principe Real e desço, no fundo no fundo sou tão merdas como aqueles que agora de manhã vão passar pelos cartões com corpos por baixo e nada dizem nada fazem, que se lixe venha mais um copo e uma fatia de bolo-rei.

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Igreja-Club

Por vezes apetece-me coisas e hoje apetece-me comprar uma igreja, mas para que é que este gajo quer comprar uma igreja perguntam vocês, tenham lá calma que chego já de seguida, nunca ouviram dizer que as galinhas apressadas parem pintos carecas? Mas tá bem vamos lá ao porquê de querer comprar uma igreja, primeiro que nada mudava-lhe a decoração, por fora enchia-a de neons e lâmpadas coloridas como as casa de putas em Amsterdão ou os saloons do faroeste que era para atrair as atenções mesmo dos mais distraídos. Por dentro nos nichos dos santos e das santas, não, das santas e dos santos que como mandam as regras da boa educação “primeiro as senhoras” embora não saiba bem se uma santa se pode considerar uma senhora embora que para o bom desenrolar da história convenha presumir que sim, como ia escrevendo nos nichos punha gajas e gajos todos nus mas depilados que era para ninguém ficar com pelos pubicos, podia escrever pintelhos mas o decoro a isso me impede, presos nos dentes, as pias de água benta, normalmente são duas, enchia-as com vodka e rum onde o pessoal se pudesse enfrascar a vontade, as outras bebidas teriam que ser compradas no altar que as igrejas mesmo que travestidas são feitas para dar lucro, quem estava por trás do altar a servir shots seriam freiras de mini saia e hábitos transparentes para a malta ficar entesoada e ir-se servir das servas, pagando claro, nos confessionários devidamente modificados para quartos com espelhos no teto dando umas valentes quecas, as biblias eram substituídas por kama-sutras de bolso que podiam ser alugados na tabacaria a funcionar no lugar onde anteriormente  se vendiam velas que agora nem vê-las.
Nesta igreja devidamente baptizada de “igreja nova dos prazeres da carne”, os coros angelicais eram substituídos por disk jockey e juke box que só passassem musica lenta, daquela vulgarmente chamada de roça pintelho assim o pessoal já sabia que quando fosse dançar, no caso de não ter dinheiro para alugar uma serva, pelo menos uma valente tesão tinha como garantida, está bem que isso é como um jogo de futebol acabar ao intervalo por recusa de uma das equipas entrar para a segunda parte, mas também esta situação estaria devidamente precavida já que a antiga sacristia estaria agora dividida em individuais devidamente decorados com fotos de gajas nuas, play-boys e filmes porno que era para a malta poder esgalhar o malho, no caso de serem gajas para além destes acessórios estariam também devidamente fornecidos de dildos e outros brinquedos que satisfizessem as piquenas, para os gajos mais abastados mas que mesmo assim não tivessem cacau para a queca da ordem poderiam sempre alugar bonecas insufláveis que seriam disponibilizadas por anões mascarados de querubins, numa banquinha devidamente montada para o efeito na dita sacristia.
Na porta não havia policia nem seguranças, os serviços da ordem seriam mantidos por nossa senhora de Fátima que ao mínimo desmando mandaria o ou a individuo/a para o inferno comunista onde seriam sujeitos aos mais humilhantes vexames como trabalhar em prol de todos, ou mesmo mortos com uma injecção atrás da orelha, para aqueles que fossem mais desordeiros mandava-os para o limbo, a ante camara do inferno, onde seriam sujeitos à gaspariana tortura de palestras financeiras ou defesas de orçamentos imaginários elaboradas sob as devidas orientações dos grandes homens de Chicago. Tenho a certeza que com estas medidas de segurança se alguém prevaricasse seria apenas uma vez, abolindo por decreto eclerical o velho proverbio de “não há uma sem  duas nem duas sem três”, esta abolição não seria extensiva à “igreja nova dos prazeres da carne” onde os clientes, melhor dito fiéis, poderiam repetir o que quisessem as vezes que quisessem, e agora digam-me lá se esta não é uma excelente ideia? É claro que é, o único senão é que não tenho guito para pôr o projecto em marcha mas para o devido efeito e caso alguém se queira tornar sócio, ou fiel, comunico que acabei de abrir uma conta no bpn onde caso assim o desejem poderão depositar um óbulo do valor correspondente a um décimo do vencimento, podem chamar-lhe dizimo, na conta com o NIB 6969 6969 6969 6969 6969 3.